sexta-feira, 9 de maio de 2014

Das palavras aos actos















Faz agora cerca de dois anos, que em Vila Nova de Cerveira, a Comunidade Intermunicipal do Minho-Lima, promoveu ao longo de 15 dias uma iniciativa designada “Alto Minho: Desafio 2020”. A ideia centrou-se na reflexão sobre a estratégia de desenvolvimento da região Minho, no âmbito do próximo quadro comunitário de apoio, cujo horizonte está ai à porta.

Dois anos depois, nos Concelhos do Alto Tâmega, promovem-se debates públicos, na tentativa de envolver a população na participação de uma estratégia de desenvolvimento comum, de acordo com a visão dos principais actores da recém-formada Comunidade Intermunicipal do Alto Tâmega (CIM-AT).

Foi o que aconteceu no Concelho de Valpaços, no passado dia 23 de Abril, onde esteve em debate o Plano Estratégico de Desenvolvimento Intermunicipal com as orientações estratégicas 2014 – 2020, no auditório do pavilhão multiusos, iniciativa promovida pelo Município em parceria com a (CIM-AT).

Não sei se esta iniciativa vem com algum atraso ou não. Contudo, a porta do cofre de Bruxelas, está quase a abrir-se e nós por cá, ainda estamos a debater o que vamos fazer com os milhões que vamos tentar lá ir buscar.

Não ignoremos a manta de retalhos em que o país está transformado, quanto à geografia administrativa e burocrática na gestão dos fundos comunitários. Divide-se para reinar, em detrimento de um poder regional devidamente instituído e legitimado pelo voto.

A desagregação da Comunidade Intermunicipal de Trás-os-Montes, talvez explique o atraso, o porquê de só agora se começar a desenvolver um plano estratégico de base intermunicipal, capaz de se constituir como a bússola orientadora da rota que importa agora seguir.

Durante mais de uma vintena de anos, percorridos os 3 quadros comunitários, as prioridades dos autarcas pareceram quase sempre incidir no mesmo. Dotar os municípios, cada um por si, sem qualquer planeamento integrado, de infraestruturas públicas e colectivas, da educação, à saúde, à rede viária municipal, aos centros de dia, aos pavilhões multiusos, às capelas mortuárias, entre outras.

Os dinheiros da Europa, serviram para tudo um pouco. Faltou planeamento, porque não houve estratégia. Nem estratégia, nem visão. Há medida que o sector da construção ia sendo alimentado por este pacote de obras públicas que foi ocorrendo um pouco por todos os Municípios, a região transmontana foi-se desertificando dia após dia.

Olhando para o fenómeno do "êxodo rural" como um facto natural, os governantes da região, continuaram a construir as suas “SimCity”, esquecendo que anos mais tarde seria complexo para as finanças públicas locais, assegurar a conservação e manutenção dos equipamentos que entretanto foram construídos, com cada vez menos população activa.

Olhemos, para um ou dois exemplos, no meu Concelho, Valpaços.

Precisávamos de um pavilhão multiusos?

Evidentemente que sim. Contudo, não precisávamos de um pavilhão multiusos, com um auditório onde não é possível realizar nenhum espectáculo cultural ou musical, simplesmente, porque o palco não tem dimensão suficiente para que isso aconteça.

Quer dizer, construam-se equipamentos, mas planeie-se a longo prazo, com alguma visão. Repare-se que não temos em Valpaços, uma sala de espectáculos, onde a Orquestra do Norte possa dar um concerto, embora existam quatro ou cinco auditórios.

Neste momento, na minha terra, já se fala em construir outro pavilhão multiusos!!! Parece que ainda não perceberam, que o tempo da formação bruta de capital fixo, ou seja, este tipo de investimentos, não são neste momento uma via para o desenvolvimento, muito menos estancam o maior problema que enfrentamos, a desertificação humana provocada pela imigração em massa verificada antes do 25 de Abril, que agora também se volta observar, paralelamente à deslocação da juventude para os grandes centros urbanos, normalmente para prosseguimento de estudos ou à procura de novas oportunidades de trabalho, não conseguindo a grande maioria, o desejado regresso à terra natal, por não encontrar trabalho, transformando-se tudo isto num ciclo vicioso.

O paradigma que agora está finalmente a findar e foi financiado pelos anteriores quadros comunitários não conseguiu estancar as designadas assimetrias regionais nem alavancar a região através do aproveitamento das suas maiores potencialidades. Durante 25 anos, Portugal recebeu cerca de 9 milhões de euros por dia, segundo o Professor e Economista Augusto Mateus, mas a verdade é que, o pais continua assimétrico e desigual, crescendo a duas velocidades, devendo a responsabilidade disso ser partilhada entre a Administração Central e a Administração Local, ou seja, Governo e Autarquias. 

Voltemos a Valpaços. É verdade que era necessário dotar o Município de infraestruturas públicas e colectivas, mas não é menos verdade que se exagerou na promoção dessas obras que fomentaram um crescimento baseado única e exclusivamente em “betão” alimentando a economia local através de um modelo que mais tarde ou mais cedo teria que esgotar. Já tive oportunidade de referir que teria sido mais útil apostar na requalificação dos bairros históricos da cidade, como são o bairro 1.º de Maio e o bairro do Tambulhão em lugar de se construir de raiz um novo bairro social que agora carece de manutenção e conservação, não apenas do parque habitacional, mas também ao nível das redes públicas de saneamento, água e electricidade que se construíram de raiz.

Por outro lado, esses bairros históricos, estão agora desertificados, com imóveis a necessitar urgentemente de serem requalificados e preservados. Fala-se hoje na requalificação e reabilitação urbana, devendo a aposta recair na requalificação das cidades e não em mais alargamento do perímetro urbano. O problema é quem vai habitar tanta casa e onde há hoje fundos para as requalificar.

Também na Avenida dos Colmeais se optou por fazer uma via rodoviária com 4 faixas de rodagem, quando duas faixas chegavam perfeitamente e teriam-se evitado gastos desnecessários. E como foi tudo em grande, os custos de manutenção no futuro, terão também a mesma dimensão do exagero.

Eis-nos à porta do Programa "Portugal 2020", o sucessor do Quadro de Referência Estratégica Nacional, o qual orienta a participação nos fundos comunitários para quatro domínios chave: competitividade e internacionalização, capital humano, inclusão social e emprego e sustentabilidade e eficiência no uso dos recursos.

O domínio da competitividade e internacionalização, concentra mais de 40% dos fundos, tendo as pequenas e médias empresas uma oportunidade de ouro para inovar, expandir a sua área de negócio e requalificar o seu capital humano. Aliás, as PME terão uma verba disponível, dotada em cerca de 6000 milhões de euros, quase o dobro do que o anterior quadro comunitário disponibilizava.

É muito importante o desenvolvimento de uma estrutura técnica, capaz de orientar e ajudar os cidadãos, os empresários e investidores a formalizar as candidaturas aos fundos disponíveis, tendo as autarquias locais um papel importante nesta matéria, ou seja, uma responsabilidade acrescida na promoção das condições em que o acesso aos próximos fundos europeus se vão promover.

É tempo de passar das palavras aos actos, planear e agir com responsabilidade e sobretudo com visão, colocando de lado o eleitoralismo bacoco motivado pela obra pública que todos gostam de inaugurar, dando lugar a um novo paradigma de desenvolvimento centrado em políticas públicas que contribuam para estancar a grave desertificação humana que se vive um pouco por todo o interior.