terça-feira, 16 de abril de 2013

Falar a uma só voz

O Jornal de Notícias reuniu no passado mês de Março os 14 autarcas do Distrito de Vila Real, no âmbito de uma iniciativa inserida nas comemorações dos 125 anos que o histórico periódico vai comemorar no próximo dia 2 de Junho e que pretende fazer a radiografia dos Municípios da região norte, promovendo o debate entre as forças vivas das comunidades locais sobre os problemas, oportunidades e potencialidades em cada um dos Distritos da região.

Todos os autarcas do Distrito de Vila Real foram unânimes em elencar a desertificação humana como um dos maiores constrangimentos dos seus concelhos, apontando ainda, um leque de soluções, no sentido de se inverter a tendência verificada nas últimas décadas e voltar a alavancar a região em termos económicos.

Olhando para trás, será unânime reconhecer que a nível infra-estrutural a região deu um enorme salto qualitativo. Qualquer Município dispõe hoje de uma considerável quantidade de equipamentos e infraestruturas, bem diferente do que acontecia há cerca de duas décadas, conferindo-lhes maior e melhor capacidade na provisão pública de bens e serviços.

Contudo, nessas duas últimas décadas, os óbitos superaram os nados-vivos, confirmando a tendência de desertificação crescente que vem assolando a região. Paradoxalmente, há medida que a oferta pública de bens e serviços se diversificava quantitativa e qualitativamente, as pessoas abandonaram cada vez em maior número as suas terras.

As causas que provocam e influenciam o êxodo rural, fenómeno que caracteriza a deslocação de pessoas das zonas rurais para o litoral, estão há muito tempo estudadas e identificadas. Não faltam teses académicas, artigos e publicações sobre o tema. Contudo apesar do diagnóstico, não foi ainda posta em prática uma estratégia capaz de estancar a evolução do problema.

São várias as causas que contribuem para evolução da problemática, nomeadamente o constante adiamento de uma política nacional capaz de promover a coesão territorial do país em lugar de fomentar assimetrias territoriais. Por outro lado, o crescente desincentivo à exploração agrícola, foi fatal para a região, que tem na terra e nos recursos naturais, o seu maior valor.

A inexistência de um poder político de base regional capaz de harmonizar a manta de retalhos territorial que vigora no actual paradigma e a falta de articulação entre o mundo académico e o mundo empresarial potenciador de massa crítica permanente, são em minha opinião, duas das principais razões para a estagnação da região.

A política de planeamento e organização do território, administração política e consequente inexistência de planeamento estratégico de base regional, continua a não permitir que a região fale a uma só voz.

A região transmontana, pode decompor-se em 3 “eixos geográficos”. Barroso / Alto Tâmega, Vila Real / Douro e Terra Fria ou Nordeste Transmontano. Estes 3 eixos englobam a totalidade dos Municípios dos Distritos de Bragança e Vila Real e ainda alguns Municípios dos Distritos da Guarda e de Viseu, considerando que existem Concelhos destes Distritos que se inserem na chamada zona do Douro. Decompondo estes Municípios por Nomenclatura das Unidade Territoriais Estatísticas (NUTS), teremos em termos de NUTS II, Norte e Centro e em termos de NUTS III, Alto Trás-os-Montes, Tâmega, Douro e ainda Dão-Lafões. Observando o território no âmbito das Comunidades Intermunicipais, no âmbito da proposta que se encontra em discussão e pretende implementar, os Municípios dividem-se em 4 ou 5 Comunidades Intermunicipais.

É este o paradigma em vigor de administração territorial. O exemplo mais recente, no quadro da revisão do estatuto das Comunidades Intermunicipais é espelho desse paradigma. A região de Trás-os-Montes tinha uma Comunidade Intermunicipal, vai passar a ter três.

Isto não é benéfico para que se possa encetar uma estratégia de desenvolvimento homogéneo. Não se ganha escala, perdem-se recursos, massa crítica, fomentam-se divisões e potencia-se a velha política de capela. O espartilho territorial em termos políticos e administrativos é um dos graves problemas e condicionantes ao desenvolvimento integrado da região.

A inexistência de um poder político de base regional, impede a afirmação da região a uma só voz e não possibilita a implementação de políticas públicas que potenciem o desenvolvimento integrado dos três eixos geográficos, respeitando necessariamente a diferenciação própria dos contextos locais.

Apesar do avanço tecnológico e educacional, com a democratização e generalização do acesso ao ensino, o nível de qualificação da população situa-se ainda hoje abaixo da média, facto que reflecte naturalmente a tendência de envelhecimento e desertificação da população, roubando-lhe massa crítica.

Torna-se necessário valorizar e apostar no ensino profissional, explorando áreas de mercado que reflictam a realidade das economias locais, promovendo também uma ligação mais profícua entre o mundo académico e o mundo empresarial. Esta articulação carece de condições e mecanismos que permitam alavancar as vantagens competitivas que cada comunidade local apresenta. As autarquias devem ser a instituição mediadora dessa articulação.

É preciso virar a página e inverter o ciclo. Mudar de paradigma, político e cultural. A região não pode continuar a falar a várias vozes, sem linhas de orientação estratégica comuns, capazes de harmonizar e promover um desenvolvimento integrado, em escala. Enquanto cada força política local e distrital, enquanto cada poder político concelhio, olhar para o seu próprio umbigo, ensimesmando-se no seu microclima a gestão política e territorial continuará constrangida, ao sabor de quem decide nos gabinetes do Terreiro do Paço.